Um importante precedente jurídico sobre tributos foi aberto! A 9ª Vara da Fazenda Pública do Estado de São Paulo concedeu liminar que garante a contribuinte a opção (facultativa) de transferir ou não os créditos de ICMS à UF de destino. Isso, no caso de remessas interestaduais realizadas entre suas filiais. Trata-se do processo 1012747-63.2024.8.26.0053, que pode ser consultado aqui.
Liminar de transferência de créditos de ICMS e ADC 49
Para dar um contexto, durante a análise dos embargos de declaração da ADC 49, o Ministro Relator Edson Fachin emitiu um voto vencedor. Ele examinou a questão dos créditos de ICMS com foco específico na necessidade ou não de os estabelecimentos de origem realizarem o estorno. Concluiu que a disposição constitucional do artigo 155, §2º, II, ‘b’, da Constituição Federal não se aplicava, pois não se tratava de uma situação de isenção ou não incidência.
O Ministro Barroso acompanhou o voto do relator, confirmando o entendimento e complementando:
“Essa circunstância, em princípio, permite que um estabelecimento acumule créditos, enquanto outro estabelecimento concentre débitos. Para o respeito à não cumulatividade do ICMS, portanto, é imperioso que se faculte aos sujeitos passivos a transferência de créditos entre os estabelecimentos de mesmo titular, de maneira a manter a não cumulatividade ao longo da cadeia econômica do bem.”
Nessa visão, o Ministro Barroso identificou a ausência de regulamentação legal, naquele momento, sobre a transferência de créditos de ICMS entre as filiais. Isso justificaria uma ação que garantisse que, a partir de 2024, na falta de regulamentação estadual sobre essa transferência, os contribuintes teriam o direito de realizá-la. Isso vai de encontro direto com nosso artigo sempre atualizado chamado “ADC 49: Quais Estados (UFs) regulamentaram o Convênio ICMS nº 178/2023?”
LC 204/2023 e Convênio ICMS 178
Porém, cabe lembrar que a LC 204/2023 e o Convênio ICMS 178, ambas de 2023, foram promulgadas antes da virada do exercício. Tanto a Lei Complementar quanto o Convênio regulamentaram a matéria e determinaram a obrigatoriedade da transferência dos créditos ao estabelecimento de destino, sendo que somente os créditos acumulados decorrentes da diferença de alíquotas foram garantidos aos estabelecimentos de origem.
Atualmente, está em debate se a referência feita pelo Ministro Barroso em seu voto se destinava apenas a enfatizar a necessidade, à época, de uma previsão legal que garantisse a transferência dos créditos, conforme posteriormente estabelecido pela LC 204/2023, para cumprir o princípio da não cumulatividade. Ou, ainda, se essa referência indicava que essa transferência seria um direito do contribuinte, com base na ideia de que a transferência obrigatória dos créditos para o estado de destino seria uma consequência lógica da aplicação de um fato gerador do ICMS, o qual foi considerado inconstitucional pelo STF.
Processo 1012747-63.2024.8.26.0053
Remetido ao DJE
Relação: 0126/2024
Teor do ato: Vistos.
Trata-se de mandado de segurança, com pedido liminar, impetrado por ◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎ contra ato coator do ILMO. SR. COORDENADOR DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA DA SECRETARIA DA FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, objetivando concessão da segurança para que não seja compelido a proceder a transferência de créditos de ICMS relativos a operações envolvendo estabelecimentos de titularidade da Impetrante, assegurando o direito ao exercício de seu direito/faculdade de transferir ou não, no todo ou em parte, os créditos correspondentes.
De início, considerando os esclarecimentos de fls. 386/388, de rigor o processamento do presente writ.
Prevalece que inexiste distinção no que tange à localidade de origem e destino das mercadorias, para fins de incidência do ICMS na transferência de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte.
De se ver que no julgamento da ADC nº 49, o Supremo Tribunal Federal adotou referido entendimento, ao julgar dispositivo da Lei Complementar nº 87/96, in verbis: DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE. ICMS. DESLOCAMENTO FÍSICO DE BENS DE UM ESTABELECIMENTO PARA OUTRO DE MESMA TITULARIDADE. INEXISTÊNCIA DE FATO GERADOR. PRECEDENTES DA CORTE. NECESSIDADE DE OPERAÇÃO JURÍDICA COM TRAMITAÇÃO DE POSSE E PROPRIDADE DE BENS. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.
1. Enquanto o diploma em análise dispõe que incide o ICMS na saída de mercadoria para estabelecimento localizado em outro Estado, pertencente ao mesmo titular, o Judiciário possui entendimento no sentido de não incidência, situação esta que exemplifica, de pronto, evidente insegurança jurídica na seara tributária. Estão cumpridas, portanto, as exigências previstas pela Lei n. 9.868/1999 para processamento e julgamento da presente ADC.
2. O deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular não configura fato gerador da incidência de ICMS, ainda que se trate de circulação interestadual. Precedentes.
3. A hipótese de incidência do tributo é a operação jurídica praticada por comerciante que acarrete circulação de mercadoria e transmissão de sua titularidade ao consumidor final.
4. Ação declaratória julgada improcedente, declarando a inconstitucionalidade dos artigos 11, § 3º, II, 12, I, no trecho ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular, e 13, § 4º, da Lei Complementar Federal n. 87, de 13 de setembro de 1996.
(STF – ADC: 49 RN 0009727-98.2017.1.00.0000, Relator: EDSON FACHIN, Data de Julgamento: 19/04/2021, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 04/05/2021) EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE. DIREITO TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS- ICMS. TRANSFERÊNCIAS DE MERCADORIAS ENTRE ESTABELECIMENETOS DA MESMA PESSOA JURÍDICA. AUSÊNCIA DE MATERIALIDADE DO ICMS . MANUTENÇÃO DO DIREITO DE CREDITAMENTO. (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA AUTONOMIA DO ESTABELECIMENTO PARA FINS DE COBRANÇA. MODULAÇÃO DOS EFEITOS TEMPORAIS DA DECISÃO. OMISSÃO. PROVIMENTO PARCIAL.
1. Uma vez firmada a jurisprudência da Corte no sentido da inconstitucionalidade da incidência de ICMS na transferência de mercadorias entre estabelecimentos da mesma pessoa jurídica (Tema 1099, RG) inequívoca decisão do acórdão proferido.
2. O reconhecimento da inconstitucionalidade da pretensão arrecadatória dos estados nas transferências de mercadorias entre estabelecimentos de uma mesma pessoa jurídica não corresponde a não-incidência prevista no art. 155, § 2º, II, ao que mantido o direito de creditamento do contribuinte.
3. Em presentes razões de segurança jurídica e interesse social (art. 27, da Lei 9868/1999) justificável a modulação dos efeitos temporais da decisão para o exercício financeiro de 2024 ressalvados os processos administrativos e judiciais pendentes de conclusão até a data de publicação da ata de julgamento da decisão de mérito. Exaurido o prazo sem que os Estados disciplinem a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos de mesmo titular, fica reconhecido o direito dos sujeitos passivos de transferirem tais créditos.
4. Embargos declaratórios conhecidos e parcialmente providos para a declaração de inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do art. 11, § 3º, II, da Lei Complementar nº 87/1996, excluindo do seu âmbito de incidência apenas a hipótese de cobrança do ICMS sobre as transferências de mercadorias entre estabelecimentos de mesmo titular.
(STF – ADC: 49 RN, Relator: EDSON FACHIN, Data de Julgamento: 19/04/2023, Tribunal Pleno, Data de Publicação: PROCESSO ELETRONICO DJe-s/n DIVULG 14-08-2023 PUBLIC 15-08-2023) Note-se que não é outro o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de sumular entendimento aplicável ao caso sub judice, senão vejamos:
Súmula 166- “Não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte.” Isso porque, nesses casos, não se verifica a transmissão da titularidade do bem, ou seja, não se vislumbra o próprio ato mercantil, imprescindível para caracterização da hipótese de incidência do ICMS, nos moldes delineados pela Constituição Federal, em seu art.155,II, ipsis litteris:
Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: […]
II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e asprestações se iniciem no exterior. Destarte, revela-se plausível e merecedor de abrigo o pleito da impetrante, valendo aqui a menção ao quanto decidido nos embargos de declaração da ADC 49 que expressamente mencionam que devem os Estados providenciarem a regulamentação da transferência de referidos créditos, do que se pode depreender, ao menos na cognição possível no presente momento, tratar-se de faculdade do contribuinte (a ser disciplinada quanto ao seu exercício) e não de dever a ele imposto.
Portanto, DEFIRO o pedido liminar para sustar, até ulterior decisão, a exigência de transferência dos créditos de ICMS nas operações interestaduais relativas a remessas de bens e mercadorias entre estabelecimentos de titularidade da Impetrante, admitindo-se o exercício do seu direito/faculdade de transferir ou não, no todo ou em parte, os créditos de ICMS das operações interestaduais de remessas de bens e mercadorias entre estabelecimentos de mesma titularidade.
Requisitem-se informações junto à autoridade coatora, cientificando-se a pessoa jurídica interessada, servindo esta decisão como mandado e ofício, podendo a parte encaminhá-la ao órgão competente para o integral cumprimento da liminar. Após, ao Ministério Público e conclusos. Intime-se. Advogados(s): ◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎ (OAB ◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎◼︎/◼︎◼︎)
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